É herdeira da ancestral Linha de Guimarães, uma das linhas estreitas da rede que ligava ao Porto e à Póvoa de Varzim, e que existiu até ao fim do século passado.
A linha de Guimarães foi então rebitolada e integrada na rede ferroviária de interesse regional, enquanto a linha da Póvoa foi canibalizada pelo Metro do Porto (devia ter sido também integrada na rede ferrovia de interesse regional do Porto e Norte Litoral).
Passados 20 anos da entrada em funcionamento desta Linha de Guimarães 2.0, é pertinente fazer uma análise à função da mesma, identificando algumas limitações que existem, no sentido de propôr soluções e intervenções para melhorar a resposta desta infraestrutura a quem procura deslocar-se neste território.
O tempo de viagem entre o Porto e Guimarães melhorou, a procura aumentou ao longo dos anos. Os comboios partem e chegam a Guimarães com boa ocupação, e nas horas de ponta viaja-se de pé partir/até Santo Tirso.
Mas nas deslocações de média distância, o tempo do comboio tem dificuldades em competir com a solução rodoviária particular e até colectiva.
Porquê?
I. Limitações infraestruturais
1) Traçado sinuoso
Afecta as velocidades máximas de circulação. A renovação da via no início do século aproveitou o traçado da via métrica primitiva, com raios de curvatura mais apertado, que penalizam velocidades.
O canal ferroviário segue entrincheirado na margem norte do Rio Ave e afluente Vizela.
2) Via única em praticamente toda a extensão
Diminui a capacidade de acomodar circulações simultâneas e nos dois sentidos da linha. Isto obriga a esquematizar horários em que os comboios que circulem em sentidos opostos se conjuguem para cruzar numa estação com duas vias.
Simplificando, isto implica que nos sectores entre estações com duas vias, só possa circular um comboio. E há sectores muito longos, nomeadamente os 8 Km (percorridos na melhor hipótese em 8 minutos) entre Guimarães e Vizela, e se somarmos 2 minutos de margem para a acomodar atrasos, baixa teoricamente a capacidade da linha para 3 comboios por hora por sentido.
Só que os outros sectores da linha não são homogéneos em comprimento e os tempos de viagem entre as outras estações para encadear cruzamentos são difíceis e conjugar sem perdas de tempo importantes.
Como as circulacões desta Linha são injectadas na/derivadas da Linha do Minho, qualquer ocorrência ou atraso num cruzamento na Linha de Guimarães, pode ter efeitos sistémicos em toda a Rede Ferroviária Regional.
Se acrescentarmos a isto a saturação do canal partilhado com a Linha do Minho entre Contumil e Ermesinde, na melhor das hipóteses a linha de Guimarães pode acomodar dois comboios por hora e por sentido.
É por isto que a IP não viabiliza de forma alguma aquela ideia peregrina do "Metro de Superfície" na Linha de Guimarães. Esta não tem capacidade para aumentar frequências para padrões desse tipo de serviço! A única e remota hipótese de colocar em prática esse tipo de serviço, só seria possível isolando a operação da Linha de Guimarães do resto da rede ferroviária: Sem Suburbanos, sem Intercidades, na prática sem qualquer ligação direta ao Porto e mais além.
3) Apeadeiros e estações mal posicionados
O sector entre Vila das Aves e Vizela, sofre do mal de ter demasiadas estações e apeadeiros em função da procura e da localização dos mesmos em relação às localidades que servem.
Os apeadeiros Cuca e Pereirinhas ficam na freguesia de Moreira de Cónegos, demasiado próximos entre si. Pereirinhas fica até demasiado próximo de Vizela. A procura gerada nestes apeadeiros é das mais baixas da Rede de Urbanos do Porto.
Importa estudar a configuração de uma nova estação em Moreira de Cónegos, num ponto mais próximo ao centro da freguesia, no lugar das sois apeadeiros.
Uma localização, com novos acessos e intermodalidade com os serviços de autocarros urbanos. E também com acesso a Vilarinho, freguesia de Santo Tirso na outra margem do rio Vizela.
Já o apeadeiro de Giesteira e a estação de Lordelo ficam na freguesia com o nome desta última, e nenhum dos pontos está num local central.
Importa também estudar uma nova localização, mais central na freguesia e com acesso também a Vila Nova do Campo, na outra margem do rio Vizela.
Cada paragem do comboio suburbano penaliza o tempo de viagem, e como efeito destas intervenções, pode-se melhorar a atratividade da operação, quer pela diminuição do tempo de viagem, quer pela melhor acessibilidade das paragens em relação aos centros populacionais.
4) O acesso ferroviário a Guimarães
A abordagem do traçado da atual linha à cidade de Guimarães, também se fez no passado com o objetivo da via seguir para Fafe, o que justifica que a atual estação de Guimarães se situe numa zona alta da cidade, porém excêntrica em relação aos principais locais geradores de procura (Hospital, Universidade, escolas e centros comerciais).
Além disso, a intermodalidade da estação é precária, pois a Central de Camionagem da cidade fica a 1,3 Km. E a rede de transportes públicos colectivos da cidade não comunica de forma minimamente capaz as linhas e os destinos. Os horários também não estão coordenados com a partida e chegada de comboios.
A atual estação e canal ferroviário tem limitações também quanto a qualquer expansão da rede ferroviária. Uma possível nova linha para Braga não pode partir da estação atual, dada a orografia.
O PDM de Guimarães revela uma reserva de canal ferroviário entre Nespereira e Silvares, e na perspectiva de uma nova linha para Braga, o interesse ferroviário da cidade de Guimarães deve aproveitar este canal para reposicionar a estação para um local mais central e integrado no sistema de mobilidade da cidade.
O afamado bairrismo de Guimarães é selectivo. A energia e o amor à terra que alavancou o progresso de Guimarães no fim do século XIX e durante o Século XX esgotou-se em futebois e em capitais disto e daquilo.
A política e as forças vivas da cidade desvalorizam esta questão do acesso ferroviário, deixaram de ambicionar e ter ilusão numa cidade melhor conectada, com melhores argumentos para uma maior relevância na rede ferroviária de interesse nacional e regional. Enquanto as outras cidades da região beneficiam já hoje de melhores acessos ferroviários, com os planos futuros mais ainda se acentuará a vantagem desses territórios comparativamente a Guimarães.
Seja daqui a 10, 20, ou 30 anos. A relevância e conectividade de Guimarães dependerá de um novo acesso e estação ferroviária e Intermodal. E esse acesso tem de compatibilizar e integrara atual Linha de Guimarães e a futura Linha do Arco Ferroviário do Minho.
A proposta de uma nova linha ferroviária entre Guimarães e Braga, obriga a estudar canais e, na nossa visão, conhecendo bem a geografia da região, o canal ferroviável está na zona oeste de Guimarães. É por onde a orografia o permite.
Ter a estação junto ao nó de Silvares seria demasiado longe do coração da cidade. As estações devem estar próximas dos locais geradores de procura à escala regional. Hospital, Central de Camionagem, Mercado Municipal, GuimarãeShopping no raio de 500 metros, é uma oportunidade para a cidade revolucionar a sua mobilidade regional/interurbana.
Nesta localização proposta, há necessidade de criar um novos acessos pedonais mais diretos, o que é um oportunidade de quebrar a barreira que a circular urbana constitui.
5) Duplicação da Linha?
O traçado da linha não é favorável a uma duplicação integral. Há a ponte sobre o Rio Ave em Caniços e o Túnel de Vizela. Há bastante construção nas margens da linha.
Ainda assim, os sectores da linha mais permeáveis à sua duplicação são o sector entre Lousado e Caniços e o sector entre Vila das Aves e Lordelo.
Se incluirmos um novo acesso ferroviário a Guimarães à equação, logo à partida duplicado, podemos obter longos sectores para cruzamentos activos sem depender das estações:
Cada sector duplicado concorre para o aumento da capacidade da linha, e nesta visão mais ambiciosa com todas as intervenções ilustradas, a capacidade da linha de Guimarães aumenta facilmente para 4 comboios por hora e por sentido (estimando por defeito).
A Concordância de Lousado, que existiu até 1995, a ser reconstruída e reactivada, pode acompanhar o aumento da capacidade da Linha de Guimarães e possibilitar circulações para o Minho e como soluções para a mobilidade regional dentro do Vale do Ave e Vale do Cávado.
II. Operação comercial
A capacidade máxima da linhanas condições atuais é dois comboios por hora e por sentido. Exceptuando os períodos entre as 7h e 9h e as 18h e 20h, esta capacidade sobra.
No longo curso, só um Intercidades por dia ascende a Guimarães. O tempo da viagem e o preço não é competitivo.
O Alfa Pendular não é tecnicamente ajustado às características da linha, e muito dificilmente o operador terá interesse em estender a operação deste serviço até Guimarães, tal como aconteceu até 2020.
Então, prevalecem os serviços Urbanos, que páram em todos os apeadeiros, havendo apenas dois serviços "Expresso" por sentido, que páram apenas nas estações mais procuradas, oferecendo uma viagem mais rápida do ponto de vista regional.
Pois é o que falta! Mais serviços rápidos, que ofereçam tempos mais competitivos, e que relevem o maior potencial do comboio na resposta às necessidades de mobilidade regionais e interurbanas.
Entre muitas outras asneiras, desgoverno e falta de competência da tutela política, a CP fraccionou a operação em unidades de negócio que separam os Serviços Regionais e os Urbanos do Porto.
Este facto causa limitações na resposta ao mercado.
Para Braga, Aveiro e Guimarães, deviam prevalecer comboios Regionais, intercalados com os suburbanos.
E os comboios regionais deviam ser contínuos entre as duas margens do Douro.
Em Campanhã, persiste uma muralha ferroviária que dificulta as deslocações de quem mora numa margem do Douro e procura deslocar-se para a outra no quotidiano. Tempos de espera, transbordos, que desmotivam muitas pessoas a utilizarem o comboios e as condenam a utilizar o automóvel.
Numa nova visão, os serviços mais rápidos da Linha de Aveiro deviam ter continuidade para Braga e Guimarães, atravessando diametralmente o Grande Porto, o que poderia dar solução de mobilidade que hoje não existe.
Claro que isto invocaria maior disponibilidade de material circulante.
No que às ligações de longo curso diz respeito, numa perspectiva mais imediata, era desejável estender mais um Intercidades a Guimarães.
Conclusão:
A ferrovia é um meio com muito potencial para responder às necessidades de mobilidade regionais e interurbanas. Só que é também um meio muito caro na sua implementação.
Por isso, quando existe tem de valer a pena e ser potenciada. A Linha de Guimarães existe mas está aquém do seu potencial. Identificam-se várias limitações, que são também oportunidades para melhorar, quer na infraestrutura, quer na operação comercial.